Histórias Súbitas - 055
/Quando as coisas começaram a mudar, não sabia se o medo maior era de que mudassem demais, de menos, ou que lhe deixassem para trás.
Quando as coisas começaram a mudar, não sabia se o medo maior era de que mudassem demais, de menos, ou que lhe deixassem para trás.
Nasceu com fome de bola, mas tinha dois pés esquerdos, então logo foi chutado.
Quando o encontraram, estava com a corda no pescoço.
Mas já não era mais força de expressão.
Quando estava longe, era como se ela fosse feita de palavras.
Tinha medo de lhe escrever, de ligar e as palavras que queria se misturarem a ela e se perderem. De longe, apenas o mínimo.
Mas com tanto que queria dizer, tinha medo de tudo entalar na garganta quando se encontrassem outra vez.
A ansiedade maior de ter um encontro naquela noite era saber que o resto do mundo não sabia disso.
Sabia que ela era tudo que precisava naquele momento.
Mas também sabia que quando ela se fosse, não poderia deixar que fosse tudo o que precisava.
"Oi, é aqui a Rua das Dores, 317?"
"Sim, é aqui mesmo."
Agradeceu e foi embora.
Um dia, a solução foi correr.
Em outro, repetiu o que havia dado certo.
Depois, não conseguiu mais mudar.
Passou o resto da vida correndo.
Certa manhã, se deu conta de que já não lembrava mais do rosto de seu amor. Suspirou, agarrando a pá. Era hora de abrir o túmulo outra vez.
Não se lembrava da ferida que havia dado origem àquela cicatriz e isso o entristecia terrivelmente.
Era uma coincidência imensa. Uma probabilidade ínfima. Um acontecimento único.
Único como os outros milhões que ocorriam naquele dia em qualquer outro lugar.
Dava nome a todas as balas de seu revólver, antes de explodir a cabeça de suas vítimas.
Nunca imaginou que sentiria falta de Francesca.
Mal sabia que assassinatos, roubos ou traição não eram problema.
No fim das contas, só ia para o inferno quem deixa a unha grande para coçar o ouvido com o mindinho.
No Norte, um feiticeiro causava destruição. Era o Mago Negro.
No Sul, um feiticeiro curava feridos. Era o Mago Branco.
No Centro, um feiticeiro confundia a todos. Ninguém sabia se ele era o Mago Azul-Esverdeado ou o Mago Verde-Azulado.
Era um grão de poeira no bigode de um ditador.
Era inocente.
Mas acabou indo para o inferno junto com ele.
Adorava seus olhos. Podia passar o dia inteiro olhando para eles.
"Francisco, larga essa mosca. Isso já tá nojento demais."
Já era batata para as 10 e nada das drogas fazerem qualquer efeito.
"Homens de sucesso repartem o cabelo para a direita," dizia a revista.
Plínio suspeitava que sua alma havia repartido o cabelo para a esquerda.
Sua maior tristeza, ao morrer, não era o que estava deixando para trás, mas tudo que estava carregando.
"Vinho? Refrigerante? Água? Poção da Vida Eterna?"
"Que tipo de vinho?"
"Branco."
"Vou tomar água, então."
Tinha que aceitar que certas liberdades não vinham sem um preço.
Ainda assim, se sentia um criminoso usando papetes com meias.
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